A turma, especialmente as amizades, me pergunta muito sobre como é essa vida de vereador. Se eu gosto, se é legal, como é o dia-a-dia do trampo.
Normalmente eu digo que gosto muitas vezes e outras não.
Aquela resposta de que a função é “legislar e fiscalizar” já não convence mais ninguém.
Pudera.
As tarefas colocadas pra quem se arvora (e consegue) ocupar essa função às vezes parecem ser as mais diversas e faz com que os dias sejam sempre diferentes e, não raro, com reviravoltas na agenda.
Uma das primeiras coisas que se deve perceber pela forma com que a gente trabalha é que aqui não tem esse lance de “o vereador”.
A gente é um mandato e todo mundo rala muito pra dar conta do compromisso com quem nos colocou aqui. Tire ontem como exemplo.
A pauta da manhã era ir no Porto da Madeira, às margens do Rio Beberibe. Bem cedo, Valcir Pereira, Beto Figueiroa e André Araripe me buscaram e seguimos juntos, acompanhados também do meu bebê, que passaria a manhã comigo. A prefeitura havia prometido limpar áreas críticas do rio e ordenar que a empresa que realiza uma obra do PAC II retire entulhos do rio e providencie outras medidas paliativas para prevenir enchentes em caso de chuva (que todo ano vem). O prazo informado pela secretaria de Saneamento não havia sido cumprido. Encontramos o canteiro de obras quase vazio, gravamos um vídeo e conversamos com o senhor Francisco, que vive no bairro há mais de 30 anos e já tá se preparando para o pior. Comprou cavaletes para levantar os móveis quando chover.
De lá a gente seguiu para a sede do INSS, onde estava havendo um ato contra as privatizações do Serpro e do Dataprev. Caso seja concluído o plano do governo federal, o Recife perderá milhões em ISS e todos os cidadãos e cidadãs do nosso país teriam o risco de ter seus dados pessoais transformados em mercadoria. Nos solidarizamos ao pessoal que tava na luta e ainda abracei os companheiros Rud Rafael e Severino Souto Alves, que estavam por lá. Findo o protesto, segui para a Câmara Municipal do Recife onde Aldo Lima e o pessoal do Sindicato dos Rodoviários do Recife e RMR me esperavam. Conversamos sobre o PL 05/2018, proposto por este grupo e protocolado por nosso mandato, que proíbe a dupla função de cobrador/motorista nos ônibus da cidade. O resultado da conversa foi um pedido à Comissão de Legislação e Justiça para discutirmos o projeto o mais breve possível – que se transformou num memorando que Rafaela Clericuzi escreveu e enviou na mesma hora.
Enquanto isso tudo acontecia, o nosso Coletivo de Negritude (Mayara Santana, Yasmim Alves, Israel Gabriel Israel Uçá e João Pedro) planejava o ano e buscava mais informações sobre o caso de racismo institucional ocorrido na noite anterior, durante a Terça Negra, para a fala que eu faria horas depois, na sessão plenária. Yasmim foi quem primeiro me alertou sobre o ocorrido e, entre uma pauta e outra, eu já havia telefonado para o comando da Guarda Municipal para conferir se o caso estava na corregedoria e informar que o mandato acompanharia o processo. Também coloquei a gente à disposição para uma formação sobre racismo.
Almocei num self service perto da Câmara e ainda consegui passar vinte minutos no Parque 13 de Maio observando o pirralha correr solto e vibrar com os patos, galinhas e tartarugas que vivem soltos por ali. Como eu, ele também não curte muito ver bicho preso.
Às 14h eu já estava com Maria Helena, no gabinete, ouvindo as ideias da ativista Sandra Costa, da Guabiraba, para a nossa cidade. Terminei a conversa ensacando a camisa e colocando a gravata para descer para a sessão ordinária. No pequeno expediente, denunciei a violência ocorrida no Pátio de São Pedro. Fala devidamente registrada e postada nas redes sociais por Catarina de Angola. Pelo zap, acompanhava enquanto Otavio R. Silveira finalizava as peças que irão compor nossa campanha de Carnaval (aguarde no local).
Ao mesmo tempo, Ana Paes articulava com o gabinete do vereador Tarcísio Motta, do Rio de Janeiro, uma ação conjunta (mais uma surpresita). André Araripe participava do planejamento do GTP+ PositHIVo. Rodrigo Cariri e Mayra Clara Vitorino espalhavam questionários do Recife Arretado com ativistas da saúde e da cultura (a iniciativa pretende elaborar um sonho de cidade para a capital pernambucana e é um dos nossos maiores xodós esse ano).
No escritório, Jaqueline Martins interpretava libras para o vídeo que iríamos postar no final da tarde e Michell Platini analisava todos os projetos de lei sobre direitos de pessoas com deficiência que tramitam na Casa Legislativa. Luana R. Varejão, morrendo de dor de dente, foi pra casa mais cedo mas não parou de andar com a organização da nossa atuação na comissão especial do Plano Diretor e da minha agenda para os próximos dias. Evlyn Hutzler, Elessandra Lima e Maria Helena se reuniram para planejar o uso do cartão alimentação para atividades de organizações sociais, enquanto Aluizio Camara andava pela cidade dando conta de despachos com a CTTU e articulando uma visita nossa a Jardim São Paulo, onde lutamos junto com a vizinhança pela revitalização do Canal Guarulhos.
À noite, ainda fui com Valcir e Mayara para o Cabo de Santo Agostinho, convidado pelo diretório municipal do PSOL Cabo. Fui conversar sobre a experiência da campanha e do mandato, colocando todos os nossos aprendizados à disposição dessa turma massa que também quer transformar a política e tá se organizando pra fazer barulho na política local agora em 2020.
Eram já quase 22h30 quando cruzávamos Afogados pensando na correria de mais um dia comum.
Mayara quem puxou o assunto:
“Eu não sei se tu cansa de contar essa história do trabalho da gente, mas eu gosto de ouvir”.
Por mim contava todo dia. Vai ser sempre novidade pra alguém.