Recife, 26 de novembro de 2020
Cartas à Queridagem
Valeu, queridagem!
Antes de mais nada, eu preciso agradecer a vocês pelos 6.319 votos que garantiram a recondução do nosso mandato à Câmara Municipal. De minha parte, estou comemorando em dobro também a vitória da minha querida Dani Portela que teve seu número digitado por mais de 14 mil pessoas e que se torna a primeira mulher negra desde sempre a ser a vereadora mais votada do Recife. Não é pouca coisa. Depois da maratona do primeiro turno, eu tomei a liberdade de descansar um par de dias e já voltei com a faca no dente para contribuir com a vitória de Marília Arraes no segundo turno. Também vai ser histórico: até agora, Recife nunca foi governado por uma mulher. Se você ainda está em dúvida sobre em quem votar, me permita essa conversa.
Começo falando de como esta aliança entre PT e PSOL foi construída. Que se diga: não se trata em momento algum de uma parceria ocasional ou pragmática. O programa que está sendo defendido na campanha foi construído ombro a ombro com pessoas de ambos os partidos e da sociedade civil. Eu coordenei pessoalmente o programa do direito à comunicação e participei de plenárias de cultura e saúde. É este conteúdo, que uniu reflexões do processo “Cidade Inteligente”, do PT, com o “Recife Arretado”, do PSOL, que deverá pautar a nossa gestão. E isso eu não apenas espero, mas tenho compromisso em lutar pela sua efetivação. A presença na chapa do psolista João Arnaldo, advogado, militante do meio ambiente, com larga experiência acadêmica, profissional e na gestão pública, nos dá ainda mais confiança de que vamos avançar.
Recife vem sendo governada pelo PSB, numa ampla aliança com vários partidos com projetos bem diferentes. Ao assumir a prefeitura, em 2013, Geraldo Júlio inverteu prioridades das gestões anteriores e tomou decisões que, aos poucos, foram afastando o poder público de suas bases mais populares. Se não dá para rotular seu governo como “de direita”, também não se pode dizer que tivemos uma gestão de esquerda, ou mesmo progressista. Nesses oito anos, a desigualdade cresceu e não é difícil apontar os motivos. Dou exemplos e digo como dá pra ser diferente.
Na saúde, optou-se por interromper um processo que visava à universalização da atenção básica para dar lugar à implementação de equipamentos de excelência, como o Hospital da Mulher e o Hospital do Idoso. Também foram construídas “Upinhas” em territórios em que já havia Unidades de Saúde da Família, contribuindo em nada para a ampliação da saúde primária. O resultado é que quase metade da nossa cidade é composta por áreas “descobertas”, em que a população simplesmente não tem acesso a nenhum serviço de saúde. Agora, enquanto Campos promete mais um equipamento “gourmet” (o Hospital da Criança), Marília avisa que vai priorizar a ampliação da atenção básica.
A escolha da prefeitura do PSB para a ação na educação foi a implementação de programas que criam bolhas de privilégios, como o de robótica. Na mesma lógica, o partido de João Campos também investiu em algumas escolas-modelo e até usou recursos para patrocinar o ensino superior privado, o que não é tarefa do município. Ao mesmo tempo, há hoje mais de 2 mil crianças fora da escola por falta de vagas. Creches não chegam a atender nem 20% das famílias que teriam direito a este serviço. Enquanto João exalta as ações do seu partido, Marília já avisa que seu objetivo principal é garantir o direito a creche de quem mais precisa.
Praticamente não há política pública de cultura. Geraldo transformou a secretaria e a fundação de cultura em produtoras de eventos. Realizam quatro grandes atividades por ano, que custam cerca de 80% do orçamento da pasta, sendo que os outros 20% vão quase na totalidade para o custeio da máquina pública. Os museus que não são administrados por organizações sociais estão à míngua e os editais de incentivo à cultura, previsto em lei, só foram aparecer nos últimos dois anos da gestão (e não tiveram nenhum contrato assinado até a hora em que eu escrevo esta carta).
O fortalecimento dos editais públicos, dos programas de descentralização da cultura, de fomento à cultura popular, de formação de plateia estão entre os compromissos da candidatura de Marília. Vale dizer que a codeputada Carol Vergolino, das Juntas, foi uma das coordenadoras da construção do plano.
Na comunicação, se podemos celebrar a implementação da Frei Caneca FM, nossa rádio pública, também podemos reclamar da falta de recursos para a emissora, que nem é unidade orçamentária. Não há programas que fomentem a comunicação popular e comunitária, mas os gastos com propaganda já chegaram a superar os 60 milhões de reais num ano, sendo quase a totalidade gastos com a mídia comercial. Um alerta: a cada R$ 4 que a prefeitura gasta com comunicação, R$ 1 vai para apenas uma empresa, a TV Globo.
No programa que eu ajudei a escrever, tem a criação de núcleos de comunicação comunitária, fortalecimento da rádio pública e o fortalecimento de iniciativas populares e independentes de produção e distribuição de conteúdo informativo.
Cito aqui áreas em que eu acompanho mais de perto. Poderia falar da habitação, em a prefeitura não terminou nenhuma obra que começou e a proposta da chapa PT/PSOL é priorizar moradia de qualidade para pessoas que vivem em palafitas. Poderia falar da política sobre drogas, que hoje é moeda de troca para garantir apoio de grupos conservadores. Poderia falar do desmonte de equipamentos da saúde mental. Poderia até falar de competência na gestão, uma das grandes narrativas da gestão de Geraldo. Quem recebeu uma prefeitura com 13% de capacidade de investimento e termina com menos de 3% não deveria se gabar.
Mas, pra mim, um dos maiores equívocos de Geraldo, João Campos e sua turma, é o erro de não saber ouvir. Talvez até por isso tenham errado tanto na condução destas políticas que citei acima. A gestão do PSB, formada prioritariamente por homens, brancos, ricos, parentes e amigos, simplesmente acha que sabe de tudo, que dá conta de tudo e que não precisa dialogar. Assim, esvaziam-se conselhos, cancelam-se conferências e interrompe-se discussões inclusive com os próprios servidores públicos. Nesses primeiros quatro anos do meu mandato, perdi a contas das vezes em que precisei ir à prefeitura para demonstrar solidariedade a servidores e servidoras que, para conseguir uma audiência com representantes do poder executivo, tiveram que ocupar com seus corpos algumas salas do prédio sede. Na Câmara, conto numa das mãos as vezes em que o prefeito apareceu para vereadores. Via de regra chegando na hora, falando rápido e indo embora antes que mais alguém ocupasse o microfone.
Nos últimos dias, além de dar conta do meu trabalho como vereador, também estou intensificando minhas atividades de campanha.
Participei de um ato com militantes do direito à infância e ouvi de representantes dos conselhos tutelares relatos de descaso. Neste mesmo dia, ouvi João Arnaldo reforçar a importância do diálogo e de se ouvir a população. Também estive num ato com representantes de diversas religiosidades, defendendo Marília e a laicidade do estado. Até domingo, continuo nas ruas. Evitarei aglomerações, mas faço questão de mostrar a cara, distribuir panfletos e adesivos e de dizer que dá pra colocar o Recife no correto caminho para a frente, sempre à esquerda.
Te convido a vir também. Mais do que isso.
Essa minha vivência na política institucional também me mostrou que não basta vencer a eleição. Será preciso muita pressão e muita luta para que a gente consiga implementar nossas propostas.
Na Câmara Municipal, me comprometo a fazer minha parte fiscalizando tudo e levantando a voz sempre que necessário. Mesmo na base, seguirei questionando, apontando possíveis equívocos, reverberando o que demandam os movimentos sociais. Conte comigo, como espero também contar contigo. E domingo é 13!